Segundo Domingo do Advento - Ano C


 


A SALVAÇÃO É OFERTA DE DEUS PARA TODOS

 

Primeira leitura (Br 5,1-9)

A primeira leitura fala de um assunto que além de repetitivo tem pouco ou nenhum interesse para nós hoje.

O texto compara a cidade de Jerusalém conquistada por Nabucodonosor da Babilônia a uma viúva, abatida pela tristeza, da qual brutalmente foram arrancados dos seus braços os filhos: lá está ela, prostrada na sua aflição, coberta com o manto de luto, recusando qualquer palavra de consolo.

Passados 50anos, no entanto, surge um profeta que anuncia o fim do luto. Aos poucos o povo vai voltando para a sua terra e começa a reconstruir, em meio a muitas dificuldades, a terra devastada.

Segunda leitura (Fl 1,4-6.8-11)

“Filipos” era a primeira comunidade cristã da Europa. A líder era uma mulher chamada Lídia.

A leitura aborda o tema da oração. Creio que a maioria das pessoas reza para pedir que Deus satisfaça seus desejos, suas necessidades e até suas vaidades às vezes bem mesquinhas.. É uma pretensão de agir sobre Deus. É uma oração que no fundo é pagã, interesseira. A oração cristã, verdadeira, pelo contrário, pede que Deus aja no coração da liberdade humana como sentido e atração. A oração incessante não é para vencer a Deus pelo cansaço, mas para que o homem se convença de que é ele e não Deus que deve mudar.

Para resumir, são três as funções da oração: a primeira função deve ser receptiva: acolher aquele Deus que nos faz existir, e nos cumula com seus dons: sua palavra, o batismo, eucaristia etc.

A segunda função é preparar-se para existir com Deus: estender aos outros o que se recebe de Deus. É partilhar a experiência de Deus em palavras e ações. “É preciso orar sempre” = ter uma atitude orante diante de Deus: agir com justiça, amar com a sua ternura, caminhar humildemente com ele em meio às dificuldades da vida.

Terceira função: devolver a existência que o homem recebe de Deus enriquecida de tudo o que produziu, num movimento de ação de graças.

Os israelitas sempre começam a oração com uma “bênção”: “Bendito sejas tu, Senhor que te compadeces diante do sofrimento do homem ... Agora eu estou sofrendo...

É claro que também podemos pedir, mas não tanto para modificar o plano de Deus a nosso respeito, mas para nos conformar com a vontade de Deus e expressar as nossas carências.

 

Evangelho (Lc 3,1-6)

Lucas mostra neste evangelho que a intervenção de Deus na história aconteceu num momento e num lugar bem definidos (cf. início do capítulo 3.)

Ponhamos a nós mesmos estas questões: a mensagem que anunciamos, a religião que praticamos estão “encarnadas” no contexto cultural e político no qual nós vivemos? Dirigem-se ao homem concreto, levam em conta a realidade social do nosso povo e da nossa nação, ou flutuam no ar, longe da realidade dos problemas concretos? Qual o impacto do anúncio do evangelho sobre o cidadão médio da nossa sociedade? Encanta, incomoda ou não interessa?

Depois de situar no tempo e no espaço a vida pública de Jesus, Lucas faz entrar em cena João Batista.

Tudo começa no deserto (v.2), lugar denso de recordações e de profundas ressonâncias sentimentais para os israelitas. Um lugar simbólico. No deserto os israelitas aprenderam muitas lições: aprenderam a desfazer-se de tudo o que era supérfluo: aprenderam a ser solidários e a partilhar tudo com os companheiros, e aprenderam sobretudo a confiar em Deus.

No tempo de Jesus, é para o deserto que se dirigiam os que queriam repetir a experiência espiritual dos seus antepassados, aqueles que queriam fugir da hipocrisia de uma religião feita de formalidades e de práticas unicamente exteriores. Lá passavam a viver os que rejeitavam a sociedade corrupta, injusta e opressora que se havia instalado na sociedade. Entre essas pessoas “contestadoras” encontrava-se também João, filho de Zacarias (Lc 1,80).

João pregava e administrava um batismo de penitência. Jesus era fã do Batista porque sentia que ali estava o começo de uma religião autêntica. Embora não tivesse pecado, Jesus entrou na fila dos pecadores em sinal de solidariedade, para junto com eles começar a libertação.

O rio Jordão tinha como única função constituir uma fronteira entre diversos povos. Para tomar posse da terra prometida, Israel, que vinha do Egito, precisou atravessá-lo (Js 3).  Com o rito do batismo, João quer preparar o povo para repetir o gesto de entrar na terra prometida com a disposição de um povo livre e temente a Deus.

Para esclarecer melhor a missão que João é chamado a cumprir, Lucas introduz uma frase do profeta Isaías: “Voz que clama no deserto: preparai os caminhos do Senhor, endireitai as suas veredas” (v.4). Cabe aos israelitas preparar o caminho do Senhor. A salvação de Deus só pode chegar se for preparada com a colaboração do homem. É sempre Deus e o homem. Como diz Agostinho: o homem sem Deus não é, Deus sem o homem não pode.

Lucas continua a citação: “Todo vale será aterrado e todo monte e outeiro serão arrasados... Todo homem verá a Salvação de Deus” (vv.5-6).

O Batista poderia ser chamado de “pregador do Advento”. Todos os anos a Liturgia nos propõe a sua mensagem, porque, tendo ele preparado o povo de Israel para a vinda do Messias, da mesma forma ele nos pode ensinar como nos devemos preparar para o Natal.

João não devia ser um homem simpático! É difícil imaginá-lo sentado à mesa, conversando com tranquilidade, contando alguma piada, sorrindo, pelo menos algumas vezes. Quando aparece no evangelho, está sempre dando bronca em alguém: ameaça com castigos terríveis, fogo, faxina geral, poda até as raízes. Fala para as pessoas, chamando-as de  “ raça de víboras”.  Ainda bem que Jesus não era como ele....

Mesmo assim as palavras severas de João tem valor para nós: há “caminhos tortuosos”, “montanhas e vales “que devem ser niveladas para que o Senhor possa chegar e entrar em nossas vidas...

 


Comentários