Décimo Nono Domingo do Tempo Comum - Ano B


 

 

DA  HUMANIDADE DE JESUS NASCE A VIDA PARA O MUNDO NOVO


Primeira leitura (1Rs 19,4-8)

Esta leitura trata do confronto dramático entre Elias, o maior profeta do Antigo Testamento, por um lado, e do Rei Acab com sua esposa Jezabel, por outro. Estamos por volta de 850 a.C.

A situação financeira de Israel estava em alta: prosperidade no comércio, constroem-se cidades e palácios, mas o bem-estar é acompanhado por injustiças sociais, pela exploração dos pobres e pela corrupção moral e religiosa. Jezabel, a rainha, tão bonita e inteligente quanto perversa mandava no marido. Filha do rei de Tiro, introduziu a religião de Baal no país. Importou cerca de 400 sacerdotes para converter as pessoas para adorar Baal, em vez de Javé.

Mas, de repente entra em cena Elias, profeta, místico e político. Usa todas as suas forças para restabelecer a fé em Javé: suas denúncias queimam como fogo, faz ameaças, opera milagres, invoca castigos do céu, faz com que durante três anos não caia chuva sobre a terra. Jezabel fica furiosa e procura eliminar Elias

Elias, desolado, abandonado também pelo povo, inicia uma peregrinação para o monte Horeb, onde repetir a experiência espiritual do grande liberador de Israel, Moisés, há 400 anos. A caminhada é longa e difícil. A um certo momento Elias fraqueja e diz: “Senhor, basta! Para mim é melhor morrer, eu não sou melhor que meus pais, se também eles fracassaram não cabe a mim mudar a situação social e as escolhas religiosas do meu povo”.

A peregrinação de Elias é imagem da caminhada de nossa vida.  Nós também nos deparamos com situações difíceis e complicadas; há momentos nos quais nos sentimos profundamente desencantados, até com a religião e com a vida das nossas comunidades.

Deus não abandonou o seu profeta, deu-lhe forças para chegar até o monte o Horeb, mas não o dispensou do esforço da caminhada. De modo semelhante também não nos abandona a nós. Mas não toma nosso lugar e não nos dispensa de fazer nossa parte.

 

Segunda leitura (Ef 4,30-5-2)

Antigamente os escravos recebiam na pele uma marca com ferro em brasa, indelével como se faz com o gado. Tinha como objetivo marcar todos os que pertenciam para sempre a um determinado senhor.

Paulo se serve dessa figura para explicar qual é a condição do cristão. No batismo, diz ele, este recebe na própria carne um selo, não gravado a fogo, mas impresso pelo Espírito Santo: portanto pertence definitivamente a Deus (v. 29)

As consequências morais que disso derivam são expressas antes em forma negativa: há vícios que devem ser evitados (v.31) e depois em forma positiva: há uma série de virtudes que devem ser praticadas (vv.32-5,2).  Os vícios catalogados são seis e todos estão relacionados com a língua: Nenhuma palavra má saia de vossa boca, mas só a que for útil para a edificação (v.29). Os cristãos, portanto, devem prestar atenção para controlar as suas palavras.

A parte positiva, ao contrário, esclarece como deve ser o comportamento do cristão: cordial, afável e sobretudo inspirado em sentimentos de misericórdia, que é a primeira das caraterísticas de Deus (Êx 34,6).

 

Evangelho (Jo 6,41-51)


O evangelho do domingo passado terminava com as palavras de Jesus que apresentava a si mesmo como o “pão descido do céu” e na explicação esclarecemos que ele é “o pão” enquanto doa ao homem a Palavra, a sabedoria de Deus, que é a única que pode saciar a fome e a sede de felicidade e de amor ao homem.

O trecho de hoje começa com a reação dos judeus diante dessa sua pretensão: “murmuravam e perguntavam: porventura não é ele o filho de José, cujo pai e mãe conhecemos? Como, pois, diz ele: desci do céu?”

A afirmação de Jesus é extremamente desafiadora escandalosa. “Ninguém, jamais viu a Deus”, afirma João no início do seu evangelho (Jo 1,18) e muito menos pode ser visto, sublinham outros textos da bíblia (Ex 33,20; 1Tm 6,16).

Acreditavam ainda os judeus que Deus manifesta a sua majestade e o seu poder através de fenômenos; relâmpagos, trovões, terremotos, ou então através das façanhas grandiosas de reis dominadores e famosos.  Não conseguem fazer penetrar em sua mente que ele possa se revelar numa figura de homem frágil e fraco, filho de um carpinteiro.

Jesus concorda que jamais alguém viu o Pai, mas ele é a revelação perfeita do pai; “quem me viu, viu o Pai”, diz ele a Felipe. Portanto é preciso observar o que ele faz, a quem defende, de quem se aproxima, quem acaricia, por quem se deixa tocar, por que se deixa beijar, com quem anda, a quem repreende...pois os seus gestos, as suas escolhas, as suas preferências são as mesmas de Deus.

A humanidade de Jesus é uma espécie de divisor de águas: para uns é o acesso a Deus, para outros é um obstáculo.

Jesus é o sacramento de Deus. É Deus visível em forma humana. Os que não conhecem Jesus se enveredam pelos caminhos mais diversos e contraditórios sobre Deus.

A descoberta de Jesus - pão do céu é um dom gratuito de Deus oferecido a todos, mas nem todos o acolhem.

Quanto a nós, resta perguntar-nos: deixamos nos iluminar pela Palavra de Deus, ou então como os judeus no tempo de Jesus, recusamos o “pão do céu” e continuamos aferrados às nossas ideias e às imagens deformadas que temos de Deus, às tradições e práticas religiosas ultrapassadas e inúteis.

Nos vv. 48-51, Jesus pela primeira vez afirma que, para ter a vida é preciso “comer o pão que é sua carne”. “carne” é uma expressão difícil e até inconveniente para nós modernos. Pode lembrar antropofagia, mas não se identifica com os músculos. Carne em sentido semítico indica a parte fraca e transitória da pessoa. Indica a humanidade inteira de Jesus, um Jesus plenamente humano. Comer a “carne” de Jesus significa acolher a sabedoria vinda do céu mesmo que a vejamos revestida de “carne”, isto é, de todos os elementos que caracterizam a fraqueza humana.

Observamos mais uma vez: ainda não se fala da Eucaristia. Jesus continua se referindo à sua mensagem, àquele evangelho que os homens devem assimilar como pão, até se tornar parte deles mesmos. Da relação que existe entre a acolhida da Palavra e o sinal do pão eucarístico falaremos no próximo domingo.

 



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