DEUS NÃO COMPACTUA COM O
MAL
Primeiro
uma observação: Para entender o meu comentário das leituras, sugiro que os
leitores abram a Bíblia e leiam o texto em questão.
Primeira Leitura (Gn
3,9-15)
Este texto
fala do início da humanidade numa linguagem simbólica; não é uma crônica do que
aconteceu de fato.
Adão e Eva pecaram ao comer do “fruto proibido”. Sentiram
vergonha ao descobrir que estavam nus; porque antes não sentiram qualquer
acanhamento? E a serpente foi condenada a deslizar pelo chão. Será que antes
tinha pernas, por acaso? Além disso foi condenada a comer pó. Mas não é o que
está acontecendo hoje.
Por aí nós já vemos que não estamos diante de uma crônica de
acontecimentos reais. A serpente era
venerada pelos cananeus, povo vizinho e pagão. Os judeus não podiam casar-se
com pagãos. Mas como o amor é mais forte do que a religião, aconteciam uniões
mixtas. Provavelmente era este o “fruto proibido”.
Na verdade, a lenda do início da humanidade quer projetar uma
luz sobre alguns enigmas que perturbam o ser humano: porque os homens sofrem e
morrem? Porque a mulher é atraída pelo homem e este procura dominá-la? Porque
pessoas vivem como se Deus não existisse? Porque nossas terras só produzem após
tantos esforços? Porque a gravidez é tão dolorosa?
A narrativa do Gênesis revela, antes de tudo, que o mal não
vem de Deus, mas sim, do homem que, negando a sua dependência frente a Deus,
estragou tudo.
Consequências do pecado: 1. Antes de tudo, o homem que peca
não se encontra mais no lugar que lhe foi designado pela criação. Por isso Deus
o procura e chama “Adão, onde estás?” 2. O distanciamento das pessoas entre
elas: Adão acusa a mulher, esta culpa a serpente. É o acontece ainda hoje: a
culpa é sempre do outro. 3. O pecado prejudica o próprio pecador. Segundo o
grande doutor da Igreja, S.Tomás de Aquino, o pecado não é uma ofensa a Deus senão na medida em que
prejudica o próprio pecador ou o próximo. Porque dizer que o pecado ofende a
Deus seria afirmar que o homem tem poder sobre Deus, o que é um absurdo que
beira a blasfêmia. 4. A última consequência é a destruição harmoniosa das
relações harmônicas com a natureza. Em vez de cuidar da natureza como um
jardineiro (cf. Gn 2,15), o homem a devasta.
Mas, será que a queda do homem será definitiva? Será que ele
continuará fazendo escolhas que o afastam de Deus, dos irmãos, de si mesmo e do
universo criado?
Não, porque no fim dos tempos, a descendência da mulher
conquistará a vitória final e esmagará a
cabeça da serpente.
Segunda Leitura (2
Cor 4,13-5,1)
Paulo escreve esta carta num momento em que as relações com a
comunidade de Corinto estão muito tensas; numerosos adversários faziam de tudo
para criar-lhe complicações e atrapalhar a sua vida.
Desgastado pelos trabalhos empreendidos e dos contratempos
suportados, Paulo sente que suas forças começam a diminuir. Mesmo assim o
apóstolo não desanima. Fortalecido pela fé ele sente dentro de si o crescimento
de um homem novo, que permanecerá para sempre (v.16). Daí uma intensa alegria e
um conforto profundo.
Os versículos 18-19 falam então do contraste entre a situação
atual “momentânea e ligeira” e a glória que, ao contrário, é “eterna e
incomensurável”.
Mas nem por isso Paulo
sugere desprezar os bens desse mundo. O homem deve servir-se deles para
viver mas não para acumular tesouros, de modo que uns tem tudo e outros pouco
ou nada.
Por fim (v. 5,1) Paulo proclama transbordando de alegria, a
sua certeza: quando se desfizer este corpo receberemos um outro nos céus não
feito por mãos humanas.
Evangelho(
Mc 3,20-35)
Podemos
dividir o evangelho em 3 partes: 1.
Vs.20-21 e 31-35 que falam da família de Jesus; 2.vs. 22-27 que referem uma
discussão de Jesus com os escribas judeus; e 3. O pecado contra o Espírito
Santo.
Jesus saiu decepcionado de Nazaré porque o povo e até mesmo
os parentes não davam nada por ele pois era “apenas ”um homem comum, e foi para Cafarnaum.
Não pôde fazer milagres em Nazaré porque, como Jesus mesmo disse: “Um profeta
só não é reconhecido em sua terra” ou como dizemos nós “santo de casa não faz
milagres”. Jesus então abandonou a
família, algo muito grave naquela época em que o conceito de família era muito amplo. Foi um escândalo. Outro
escândalo: Jesus não casou. Ora, o casamento era uma lei de Deus. Homem que não
casa não é homem... Por isso tudo Jesus estava “queimado” em Nazaré.
Passados alguns meses chegaram notícias perturbadoras para os
parentes de Jesus em Nazaré. Ouviram dizer que Jesus fazia pouco caso das
“sagradas” tradições dos antigos: não respeitava o sábado, não dava valor ao
jejum, era amigo dos pecadores, tinha contato com pessoas “impuras”...Por isso
muitos o consideravam um demente e um “samaritano”, isto é, um herege (cf.Jo
8,48-52). Daí sua mãe(!!!) e seus irmãos foram atrás dele para trazê-lo
para casa, pensando que ele havia perdido o juízo (Mc 3,21).
Cabe aqui uma observação: Mc 3,21 dá a entender que Maria era
uma mulher muito “humana”, do interior, pobre, sofrida, como tantas mães do
nosso interior, cuja única alegria são seus filhos. As tantas mistificações de
Maria, os tantos títulos, na verdade, são expressões da necessidade do povo
pelo lado feminino de Deus que sempre foi entendido e expresso (erroneamente)
como masculino. Daí a bela expressão de Leonardo Boff: “Maria é o rosto materno de Deus”. Por
outo lado, porém, desfiguram o rosto de
Maria, e a afastam de nós fazendo dela quase uma deusa(cf. a imagem do “Pai
Eterno” onde Maria aparece como membro da SS.Trindade), quando, na verdade, ela
era uma simples mulher do povo: mãe de Jesus. É este o único verdadeiro título
de Maria (aceito também pelos evangélicos): Mãe de Jesus. Este título não
impediu que Maria tivesse que viver a vida humana como tantas outras mães.
Ao chegarem a Cafarnaum, os parentes encontram Jesus que já
está morando numa casa e falando para um grupo de pessoas que já formam a sua
“nova família”. Não entram; ele que deve sair: querem levá-lo de volta para
Nazaré.
Ora, as pessoas que estavam sentadas ao redor dele disseram-lhe: “Eis que tua mãe e teus irmãos
estão aí fora e querem falar com você.” Ele respondeu-lhes: “Quem é minha mãe e
quem são meus irmãos?” E correndo o olhar sobre o grupo que estava sentado ao
redor dele, disse: “Eis aqui minha mãe e meus irmãos. Aquele que faz a vontade
de Deus, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe”. Maria deve ter ficado um
pouco chateada!
Jesus havia formado uma nova família não mais formada por
laços de sangue, mas pela escuta da Palavra de Deus. Maria e os irmãos de
Jesus, escandalizados, tiveram que voltar para casa.
Os dois grupos de pessoas, o que está dentro de casa com
Jesus e o que está fora da casa tem para Marcos um sentido simbólico.
Estes parentes que ficaram de fora representam aqueles
cristãos que conhecem bem a Jesus, tem seus nomes inscritos no registro de
batismo, tem a “lembrança” da Primeira Comunhão..etc. , mas quando percebem que
Jesus ensina uma doutrina contra o “bom senso”, então já não o entendem, nem o
seguem.
Os versículos 20-26 referem uma discussão entre Jesus e os
escribas judeus (advogados da Lei) vindos de Jerusalém. Acusam Jesus de
expulsar demônios em nome de satanás. Respondendo Jesus disse: Se um reino está
dividido contra si mesmo, não tem futuro.
Os vs.28-30 falam do pecado contra o Espírito Santo. Que
pecado será este? É atribuir ao demônio o que é obra de Deus. Uma
“sacanagem”...
Jesus usa uma linguagem dura à semelhança dos pregadores de
sua época para causar impacto. Mas este pecado pode se repetir hoje quando, por
exemplo, pessoas se opõem às boas que
outros praticam; ou quando criticam ou
até perseguem os profetas que falam em nome de Jesus...
Mas será que os pecados contra o Espírito Santo não tem
perdão? Calma! Jesus não está falando neste sentido. Trata-se de uma imagem,
não de uma informação. Jesus está falando do presente, não do futuro que
permanece envolto no mistério do amor de Deus.
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