ELES VOS PRECEDERÃO NO REINO DE DEUS
Primeira
leitura (Ez 18,25-28)
O profeta Ezequiel se encontra
entre os exilados israelitas na Babilônia (587-538 a.C.). Sem pátria vivem
curtindo saudades da sua terra distante (Palestina), das suas casas, das suas
lavouras e se perguntam quem seria o culpado de tal desgraça. Infelizmente o
povo deixou-se possuir por uma espécie de fatalismo, imaginando pagar uma
dívida contraída pelos pecados dos seus antepassados
Ezequiel intervém para condenar este modo de
pensar. Afirma: cada um é responsável pelas suas próprias ações, não
se descontam os pecados dos outros.
Nós também podemos passar pela tentação de atribuir
a outros a culpa pela nossa situação: insucesso ou desgraça; é a eterna mania
de culpar os outros em vez de assumir a própria
responsabilidade: Adão deu a culpa à mulher, a mulher culpou a serpente
etc.
Esta maneira de pensar pode justificar a preguiça
ou a inércia. Na verdade, nada de grande na vida acontece por acaso, tudo
requer esforço. O ser humano está exposto a três grandes forças: a gravidade, a
inércia e a transcendência. É esta última, e só esta, que nos faz crescer.
Segunda leitura (Fp 2,1-11)
A comunidade de Filipos era excelente e Paulo se
orgulhava disso. Ao mesmo tempo havia conflitos internos: a competição e o
desejo de receber elogios, de considerar-se superior aos outros, o desinteresse
pelo bem comum, tudo isso estava presente na comunidade. Com muita delicadeza
Paulo escolhe umas palavras para enquadrar este problema: “Nada deveis fazer,
diz ele, por espírito de egoísmo ou para mostrar superioridade sobre os demais;
mas cada um, com toda humildade, considere os outros superiores a si, não
procure o próprio interesse, mas o dos outros (vv.3-4).
Para convencer melhor os filipenses, Paulo introduz
na sua exortação um dos hinos cristológicos mais importantes do Novo Testamento
(vv.6-11).
Ele conta a história de Jesus. Diz: Ele, Filho de
Deus, já existia antes de se encarnar. Quando se fez um de nós, ele como que se
despojou de sua grandeza divina e apareceu aos nossos olhos na baixeza e na
fraqueza do homem, esvaziando-se daquelas realidades humanas das quais com
dificuldade abrimos mão: prerrogativas, posição social, honra, dignidade, fama
e, o que é mais precioso, a própria vida. Jesus perdeu todas essas coisas.
Desceu ao poço mais profundo da miséria e solidão humanas.
Esta vida de Cristo o conduziu à glorificação.
Eis, pois, um exemplo de vida a ser imitado
pelos filipenses.
Evangelho (Mt 21,28-32)
Mais uma vez, como no domingo passado, o tema do
evangelho é a religião dos merecimentos.
Para deixar mais claro o seu pensamento, Jesus
conta uma parábola com três personagens: um pai e dois filhos. O
primeiro filho é, sem dúvida, Israel, que no Antigo Testamento é chamado “Filho
de Deus”. “Do Egito chamei meu filho”, diz o Senhor pela boca do profeta Oséias
(11,1); “Israel é meu filho primogênito, declara o Senhor a Faraó (Ex4,22).
Mas o segundo filho? Esperemos pelo fim da história.
O pai mandou os dois filhos trabalhar na roça. O
primeiro filho respondeu: “É comigo mesmo”. O segundo, pelo contrário,
resmungou: Ah! Hoje não tenho vontade”.
Agora a parábola começa a ficar clara: o
primeiro filho é Israel que ouviu a palavra do Senhor, respondeu ao
seu chamado e fez com ele uma aliança. O segundo representa os
pagãos. O discurso, de qualquer modo, se torna muito provocador:
os pagãos, pensam os ouvintes, não prestam. Como pode, agora, Jesus elevar
aqueles malditos à dignidade de filhos?
As surpresas, porém, não acabaram.
O mestre continua a sua história: o
primeiro filho era de fato muito disposto: ele disse “sim, sim”, mas a
seguir nada fez, enquanto o segundo pensou melhor, arrependeu-se
pela resposta dada ao pai e foi trabalhar na roça.
O que aconteceu foi o seguinte, o movimento Jesus
após a ressurreição não vingou em Jerusalém: o grupo de Pedro não deu em nada,
o grupo de Tiago idem, os apóstolos sumiram. Dos diáconos um foi martirizado, o
outro, Felipe, evangelizou a Samaria. Mais. Os discípulos de Jesus foram
perseguidos em Jerusalém e se dispersaram nas cidades vizinhas, dos pagãos, e
estes sim, acolheram o evangelho de Jesus. E foi assim que o movimento Jesus
sobreviveu.
Mas foi sobretudo Paulo que deu vida à Igreja. Ele,
o maior missionário de todos os tempos e também o maior teólogo. Através dele
que as igrejas se encheram de pagãos. Eles são o segundo filho, que primeiro
disse não, mas depois disse sim.
Na Igreja, nas nossas comunidades cristãs, no
mundo, sempre há dois filhos: alguns que através da iniciação cristã (Batismo,
primeira eucaristia, Crisma) disseram “sim”, mas depois, na vida prática
transformam o “sim” em muitos “não. Por outro lado, há muitas pessoas que nunca
disseram um “sim” explícito para Deus, mas na prática de cada dia, amam o
próximo, são solidários nos acidentes e catástrofes e executam muitas obras de
caridade. Estes, ainda que não batizados ou não praticantes,são verdadeiros
filhos de Deus.
Às vezes cada um de nós, se comporta como
o primeiro filho e às vezes como o segundo.
Melhor seria se fôssemos como o terceiro filho:
aquele que diz “sim” e vai mesmo! Dele não se fala na parábola... mas
certamente há muitos deles nas nossas comunidades.
O primeiro filho (Israel) faz muitas
coisas: oferece sacrifícios, celebra solenes liturgias no templo, recita longas
orações..., mas é isto que o Pai pediu?
O segundo filho (os pagãos), ao
contrário, tem consciência do seu distanciamento de Deus, não tem a ilusão de
estar cumprindo a sua vontade, está consciente de ter dito “não”. Não tenta nem
ao menos enganar a si mesmo cumprindo preceitos inventados pelos homens, não
tranqüiliza a própria consciência com práticas vazias que nada tem a
ver com a verdadeira religião.
A sua consciência de ser pobre, fraco, frágil,
produz nele a predisposição para receber por primeiro o dom de Deus. Em
seguida... o outro irmão seguirá o mesmo caminho.
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