SEXTO DOMINGO DA QUARESMA (RAMOS) – ANO C



            JESUS SERVO SOFREDOR E TESTEMUNHA FIEL

Primeira leitura (Is 50,4-7)
A leitura fala de um misterioso “Servo do Senhor” que foi surrado, insultado, esbofeteado, cuspiram no seu rosto; mas ele não reagiu: continuou confiando no Senhor.
Ouvindo esta leitura, espontaneamente somos levados a fazer uma comparação entre o que aconteceu com este Servo e aquilo que os soldados de Pilatos fizeram a Jesus. Ambos foram tratados da mesma maneira.

Segunda Leitura (Fl 2,6-11)
Paulo gostava muito da comunidade de Filipos, a primeira na Europa, liderada por uma mulher: Lídia. Não obstante ser uma comunidade fervorosa, havia invejas entre os membros querendo uns se impor aos outros.
É por isso que Paulo, na sua carta, recomenda “Nada façais por espírito de partido ou vanglória, mas que a humildade vos ensine a considerar os outros superiores a vós mesmos. Cada qual tenha em vista não os próprios interesses e sim os dos outros”(2,3-4).
Em seguida Paulo argumenta com o exemplo de Jesus que ao encarnar-se não fez conta da sua natureza divina, mas humilhou-se fazendo-se um dos nossos. Mas devido à sua obediência o Pai o ressuscitou e o estabeleceu como modelo para todos os homens e lhe deu o poder e o domínio sobre todas as criaturas.
Também a nós é dirigido o mesmo apelo para refletirmos sobre o exemplo de Cristo, apresentado por Paulo: humildade e serviço aos outros.

Evangelho (Lc 22,14 – 23,56)
Embora todos os evangelistas narrem a Paixão de Jesus, nesse comentário vou limitar-me às características próprias de Lucas.
1. No seu evangelho, Lucas costuma destacar a bondade e a misericórdia de Jesus. No Monte das Oliveiras, para defender o Mestre, os discípulos decidem: “Senhor, agora nós atacaremos com a espada” e Pedro entra em ação e corta a orelha do servo do sacerdote. Jesus intervém e censura severamente a Pedro por seu gesto precipitado. Em seguida preocupa-se com o ferido e a cura (22,51). A mensagem é clara: o discípulo não só não pode agredir ninguém, mas tem de estar disposto a curar as feridas provocadas pelos  outros.  O cristão tem “adversários”, mas não “inimigos”.  “Adversários” são aqueles que escolhem os caminhos que levam à morte, aqueles que deformam o projeto de Deus. Devem ser corrigidos. “Inimigos” são aqueles que tem de ser destruídos, esmagados, humilhados, eliminados.
Mais adiante Lucas refere que após ter renegado o Mestre, Pedro saiu para fora e desatou a chorar. Lucas, porém, nota que o Senhor, voltando-se, olhou para Pedro. Este gesto comovente mostra a compreensão de Jesus pela fraqueza do seu discípulo e é sinal do perdão que lhe concede. Lucas quer ensinar aos cristãos que não devem desencorajar-se diante das fraquezas e dos pecados.
Durante a paixão os discípulos fizeram um papel muito feio (Mc 14,50): fugiram. Lucas, porém, tenta salvar a pele dos apóstolos dizendo que eles não fugiram, mas se mantiveram à distância.  Lucas é o único evangelista a registrar que Jesus, alguns instantes antes de exalar o último suspiro ainda tem a energia para dizer: Pai, perdoa-lhes este pecado, porque não sabem o que fazem (23,34). Não se referia aos soldados, mas aos verdadeiros responsáveis pela sua morte: as autoridades religiosas do seu povo.
2. No que se refere à instituição da Eucaristia, Lucas é o único que relata este mandamento do Senhor: “Fazei isto em memória de mim” (22,19). Mas estas palavras não devem limitar-se a um convite para repetir liturgicamente o seu gesto: O “partir o pão” teve para Jesus um valor simbólico: nele está resumida toda a sua vida, repartida e doada para todos os homens. Só aquele que reparte a sua vida com os outros, pode, em verdade, “partir o pão eucarístico” com o coração puro. Fora desta linha de doação, a repetição do gesto litúrgico se reduz a um gesto vazio, e, às vezes hipócrita.
3.No momento da agonia, quando foi tentado a que se esquivasse e escolhesse outros caminhos, diferentes daqueles traçados pelo Pai, Jesus orou e sua oração foi atendida. Não foi libertado da morte, mas foi iluminado e fortalecido com a força do Espírito e deu sua adesão incondicional ao Pai.
4. Lucas apresenta Jesus como o Messias misericordioso e compassivo. Aliás a misericórdia é um dos eixos de Lucas e Jesus se mostra misericordioso do começo ao fim. Pede aos discípulos que sejam misericordiosos como o Pai é misericordioso (6,36); pede para fazer o bem aos que nos odeiam (6,27), rezar pelos que nos amaldiçoam e amar os inimigos.  Comove-se até as entranhas ao ver a aflição da viúva de Naim.
5.Há um episódio que nos é narrado exclusivamente por Lucas: o encontro com Herodes. Não era político hábil, nem maníaco como o pai (Herodes o grande), era só um fraco, um corrupto, um homem sem personalidade. Queria ver Jesus para assistir a algum milagre.... representa aqueles cristãos que por serem fieis às práticas religiosas esperam milagres: saúde, emprego, sucesso na vida, riqueza etc... Praticam uma religião interesseira que não tem valor de salvação.  Os que se aproximam do cristianismo por esses caminhos devem saber que não terão qualquer resposta por parte de Jesus. Não encontrarão o que estão procurando. O cristianismo é a religião do amor e do dom da vida em benefício do próximo, não mercado onde se compram milagres. Jesus chama os que pensam assim de “raça perversa e sem fé” (Mt 16,4).
6. Lucas é o evangelista que, mais do que os outros, fala das mulheres que, durante a vida pública, acompanharam o Mestre (Lc 8,1-3). É também o único a registrar que, ao longo do caminho para o Calvário, Jesus encontra um gruo de mulheres que choram e batem no peito(23,27-31). Elas não são responsáveis por aquilo que está acontecendo, choram pelo pecado cometido por outros. Não são os homens que, muitas vezes, provocam desgraças, desencadeiam  violências (feminicídios...)? E quem aguenta as consequências? Quem chora? Os mais fracos, as mulheres.
7. Todos os evangelistas relatam que Jesus foi crucificado no meio de dois criminosos. Não eram ladrões de galinha ....(para ladrões não tinha cruz), mas bandidos tipo Lampião, cangaceiro do nordeste.... Um deles diz :”Jesus lembra-te de mim quando tiveres entrado no teu reino”. E Jesus agonizante, lhe respondeu: “Em verdade te digo, hoje estarás comigo no paraíso”. É interessante notar que Jesus que vivera no meio de pastores, publicanos e prostitutas, agora volta acompanhado por alguém que representa todos nós: um pecador, recuperado pelo seu amor.

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