DA OPRESSÃO À
LIBERDADE
Primeira leitura (Is 43,16-21)
Estamos por volta dos anos 550 a.C. Os israelitas no exílio sentem-se
abandonados por Deus. O trabalho na lavoura era duro, trabalhavam o dia
inteiro, voltavam para casa extenuados e queimados pelo sol. Recordavam com
saudade as maravilhas que se dizia Deus tinha operado quando da saída do
Egito: pragas, passagem do mar vermelho,
maná, água que jorrava da rocha etc... Na verdade, foi uma fuga que deu certo,
mas para Israel, povo religioso, era obra de Deus (cf. o filme “os dez
mandamentos”). E agora, parece que Deus
estava ausente. Segundo Gustav Jung o homem é habitado por um arquétipo: a
busca do maravilhoso. Então tudo o que se refere a Deus é grande, maravilhoso,
espetacular. Daí também a busca por milagres, visões, aparições....
Entra em cena Ciro, rei dos persas que derrotou a Babilônia.
Através de um decreto, ele liberta os hebreus e deixa que voltam para casa.
Para os israelitas o verdadeiro libertador foi Javé que usou Ciro como
instrumento. Para que a volta à pátria seja mais agradável e cômoda, o Senhor
abrirá um caminho no deserto, fará brotar nascentes de água no deserto para
saciar sua sede, ao lado dos animais selvagens, dos chacais, avestruzes, como
no paraíso terrestre... Esta é a profecia de Isaías. trata-se, evidentemente,
de figuras para mostrar que Deus não se esquece do homem.
Segunda leitura (Fl 3,8-14)
O cristianismo exige um coração jovem, em condição de
aceitar as novidades. Jesus era jovem, não se limitava a repetir as coisas
ensinadas pelos rabinos do passado.
Também Paulo tinha um coração jovem. Depois que encontrou a
Cristo ele rompeu radicalmente com o seu passado de fariseu que achava que
conseguiria a salvação pela observância da Lei judaica, e aceitou plenamente a
novidade do Evangelho. Daquele dia em diante tudo aquilo no qual ele confiava
perdeu o valor e considerou como “lixo” (v.8).
Paulo é um exemplo para nós. Não é fácil romper com o
passado de uma hora para outra. Imaginemos como é difícil renunciar ao modo de
pensar que assimilamos desde a infância, segundo o qual consideramos lógico,
normal e certo, acumular bens materiais, buscar vantagens para si mesmos,
competir com os outros em vez de servi-los, gozar a vida sem qualquer
preocupação pelas necessidades dos demais.
Contudo, bem sabemos, estas atitudes não são compatíveis com a vida que
Cristo pediu aos seus discípulos. Não é fácil aceitar a sua maneira de pensar,
é até chocante e “escandalosa”...
Evangelho (Jo 8,1-11)
É surpreendente ver Jesus rodeado de tantas mulheres: amigas
íntimas como Maria Madalena, ou as irmãs Marta e Maria de Betânia. Seguidoras
fiéis como Salomé, mãe de uma família de pescadores. Mulheres enfermas,
prostitutas de aldeia... De nenhum profeta se diz algo semelhante.
O que será que as mulheres viam em Jesus? É que Jesus olhava
as mulheres com olhos diferentes. Tratava-as com uma ternura desconhecida.
Defendia sua dignidade e as acolhia como discípulas. Ninguém as havia tratado
assim.
Entende-se assim sua reação quando lhe apresentam uma mulher
surpreendida em adultério. Ninguém fala do homem adúltero. É o que acontecia
sempre naquela sociedade machista. Condena-se a mulher porque desonrou a
família e se desculpa com facilidade o homem.
Jesus se vê diante de uma sinuca: A lei de Moisés mandava
apedrejar as adúlteras. Qual seria a
posição de Jesus? Jesus poderia se safar de maneira fácil: “ o Sinédrio está aí
a 50 metros, porque vocês não levam a mulher para ser julgada pelo Sinédrio?”
Mas Jesus, muito vivo, não queria perder a ocasião para desmascarar a
hipocrisia dos acusadores hipócritas
para aumentar o suspense ele rabiscava algumas coisas no chão, depois com
simplicidade e valentia admiráveis, impõe verdade,, justiça e compaixão: “Quem
estiver sem pecado, que atire a primeira pedra”. Os acusadores se retiraram
envergonhados, a começar pelos mais velhos...
Jesus se dirige àquela mulher humilhada com ternura e
respeito: “Também eu não te condeno”. Vai, continua caminhando em tua vida e,
“de agora em diante, não peques mais”. Jesus confia nela, deseja-lhe o melhor e
a anima a não pecar mais. De seus lábios não sairá nenhuma condenação.
Quem nos ensinará a olhar hoje a mulher com os olhos de
Jesus? Quem introduzirá na Igreja e na sociedade a verdade, a justiça e a
defesa da mulher ao modo de Jesus?
Nós cristãos ainda não fomos capazes de extrair todas as
consequências que esta atuação libertadora de Jesus encerra diante da opressão
da mulher. A partir de uma Igreja dirigida e inspirada majoritariamente por
homens, não conseguimos tomar consciência de todas as injustiças que a mulher
continua padecendo em todos os âmbitos da vida.
O que podemos fazer em nossas comunidades cristãs? Em
primeiro lugar, atuar com vontade de transformar a Igreja. A mudança é
possível. Temos que sonhar com uma igreja diferente, comprometida como ninguém
em promover uma vida digna, justa e igualitária entre homens e mulheres.
É preciso que a Igreja reaja de maneira profética contra a
“cegueira” generalizada dos homens, incapazes de captar o sofrimento injusto a
que se vê sujeito a mulher, só pelo fato de ser mulher (cf. os feminicidios...).
Em muitos setores é um sofrimento “invisível” que não se conhece ou não se quer
reconhecer. No evangelho de Jesus há uma mensagem particular, dirigida aos
homens que ainda não escutamos nem anunciamos com fidelidade.
Antes de atirar pedras contra alguém, devemos saber julgar
nosso próprio pecado. Talvez descubramos então que muitas pessoas não precisam
de condenação da lei, mas de alguém que as ajude e lhes ofereça uma
possibilidade de reabilitação. O que a mulher adúltera precisava não era de
pedras, mas de uma mão amiga que a ajudasse a levantar-se. Jesus a entendeu.
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