Solenidade da Mãe de Deus





DEUS SE SOLIDARIZA COM SEU POVO

Primeira leitura (Nm 6,22-27)
Esta leitura traz o texto da bênção usada pelos sacerdotes, no encerramento das celebrações litúrgicas no templo.
“Abençoar” é a formulação de um desejo, de um voto, para que a alguém aconteçam coisas boas na vida. Não tem nada a ver com magia, não importa quem a pronuncia. As pessoas “abençoadas” terão os mesmos problemas e as mesmas dificuldades dos demais homens. Serão, porém ajudados a enfrentá-los pela força da nova luz que para eles provém da fé.
D’entre os benefícios solicitados talvez o mais importante seja a paz. Se dermos ouvidos ao Espírito que no batismo Deus infundiu no nosso coração, se todos os domingos escutarmos apalavra de Deus e seguirmos o exemplo de Jesus, durante este ano nós não provocaremos guerras, nem discórdias, nem divisões, mas seremos construtores da paz.

Segunda leitura (Gl 4,4-7).
Deus, como criador,  é pai de todos os homens. No entanto Paulo afirma emocionado que agora o cristão já não é escravo, mas filho, e pode gritar “Abba”.
O Pai-nosso não é propriamente a oração de todos os homens: pode ser recitado somente por aqueles que aceitaram Jesus e o seu Espírito e receberam o seu Espírito no Batismo. Se somos filhos de Deus, se possuímos o seu Espírito, então somos também irmãos uns dos outros.

Evangelho (Lc 2,16-21)
O Evangelho de hoje é a continuação do trecho  lido na noite do Natal. Junto ao berço de Jesus estão de novo os pastores, que na sociedade judaica eram classificados como pessoas impuras e desprezadas. Foram eles, e logo eles, os primeiros a visitar Jesus. É  oportuno observar que não encontraram nada de extraordinário. Encontraram somente um menino, com seu pai e sua mãe. Mas naquele ser fraco, necessitado de ajuda e proteção, eles reconheceram o Salvador.
Esta visita dos pastores  contém uma lição muito importante para cristãos, católicos, evangélicos e pessoas religiosas em geral que para crer exigem muitas vezes sinais extraordinários, tais como milagres, “aparições” ou outras manifestações prodigiosas de Deus. Esse fascínio pelo maravilhoso está profundamente enraizado no inconsciente humano. É um arquétipo segundo Gustav Jung. Tudo o que está relacionado com Deus é descrito como maravilhoso, espetacular. A Bíblia está cheia dessas “maravilhas”. São símbolos. Linguagem humana, não intervenções de Deus.Se nós nos fixarmos nas expressões “maravilhosas” do texto, corremos o risco de não perceber a mensagem de Deus que está por trás das palavras. Os adversários de Jesus diziam: “mostra-nos um sinal do céu que nós creremos em você”. Jesus respondeu: “Esta geração perversa pede sinais, mas não lhes será dado outro sinal senão o  do profeta Jonas..”.(Lc 11,29)
A verdadeira fé não precisa destes apoios frágeis e equívocos. Um exemplo: de 1930 a 1980 foram catalogadas 300 “ aparições” de Nossa Senhora. A Igreja  não reconheceu nenhuma delas como autêntica...
Discípulo é aquele que, diante da mensagem de Deus que ressoa no evangelho, sente-se provocado, responde com um “sim” e não procura outras provas além da Palavra, porque nela reconhece a voz do Pai que o chama à salvação.
Os pintores da tradição cristã representam os pastores se ajoelhando diante de Jesus, deitado na manjedoura. O evangelho, porém, não diz nada disso. Diz apenas que os pastores observam, pasmados, extasiados, a obra estupenda que Deus operou a favor dos homens; a seguir correm para anunciar aos outros a própria alegria e todos os que os escutam também ficam admirados (v.18).
Creio que o encanto da festa do Natal está justamente nisto: Deus se nos apresenta na forma de uma criança pobre deitada numa manjedoura. Nunca o teríamos imaginado assim. Nós pensamos num Deus majestoso e onipotente, e Ele se nos apresenta na fragilidade de um menino fraco e indefeso. Imaginamo-lo grande e longínquo, e Ele se nos apresenta na ternura de um recém-nascido. Como sentir medo deste Deus? Tereza de Lisieux, declarada doutora da Igreja em 1997, dizia assim: “Não posso temer um Deus que se fez tão pequeno para mim...Eu o amo”.
O relato dos pastores nos oferece uma chave para aproximar-nos do mistério de Deus. Deus não deve ser procurado no admirável e maravilhoso, mas no ordinário e cotidiano. Não se deve investigar no grande, mas rastrear no pequeno. Os pastores nos mostram em  que direção procurar  o mistério do Natal: “Vamos a Belém”. Mudemos nossa idéia de Deus. Façamos uma releitura de nosso cristianismo. Voltemos ao início e descubramos um Deus próximo e pobre. Acolhamos sua ternura. Para o cristão, celebrar o Natal é “retornar a Belém”.
Continua sendo verdade aquilo que o primeiro Natal insinua. Os pobres tem um coração mais aberto a Jesus do que aqueles que vivem satisfeitos. Seu coração encerra uma sensibilidade para o Evangelho que nos ricos ficou muitas vezes atrofiada. Têm razão os místicos quando dizem que para acolher a Deus é preciso “esvaziar-nos”, “despojar-nos” e “tornar-nos pobres”.
Nos primeiros capítulos do seu Evangelho, Lucas destaca com freqüência, o espanto e a alegria irreprimíveis das pessoas que se sentem envolvidas no projeto de Deus. Isabel, ao saber que estava grávida, vai repetindo para todos: “Eis o que operou em mim o Senhor!” (Lc 1,25). Simeão e a profetiza Ana começam a louvar a Deus que lhes concedeu ver a  salvação preparada para todos os povos (Lc 2,30.38);Maria e José também ficam deslumbrados, pasmos(Lc 2,33.48).
A reação de Maria diante da visita dos pastores deve ser destacada. O evangelho diz que ela “conservava todas estas coisas, meditando-as no seu coração” (v.19). O que quer dizer isso? O evangelho quer ensinar que Maria sabia ver em tudo o que acontece o projeto de Deus. Não se porta como nós que, muitas vezes, nos deixamos perturbar por qualquer contrariedade insignificante ou por qualquer novidade da qual tomamos conhecimento. Ela sabe “meditar no seu coração” tudo, e desta forma sempre consegue descobrir o projeto do amor de Deus.
Nós sabemos que, junto com  o leite, as mães também infundem a primeira educação aos filhos. Sabemos que os ensinamentos recebidos das mães jamais são esquecidos, porque são transmitidos com amor e delicadeza, com beijos, carícias e palavras doces. Todas as mães  devem ter plena consciência que é da maior importância tudo o que fazem, tudo o que dizem, todo o que ensinam aos filhos. Estes, mesmo antes de falar, já estão aprendendo dos seus gestos, dos seus sorrisos, dos seus olhares.
Mãe de Jesus Maria foi também a primeira catequista de seu filho. Foi ela que junto com José introduziu o filho nas tradições dos Santos patriarcas e na doutrina do AT. Mas ao crescer em sabedoria e graça, como diz Lucas, Jesus foi demonstrando ter uma experiência extraordinária de Deus que Maria nem sempre entendeu, como quando Jesus foi reencontrado no templo e disse a seus pais que ele devia ocupar-se das coisas do Pai. Lucas nos diz que Maria não entendeu o que Jesus quisesse dizer mas conservava estas coisas meditando em seu coração...  Modelo de mãe, Maria foi também modelo de discípula “Eis aqui a serva do Senhor...”

Comentários