Décimo Quarto Domingo do Tempo Comum – Ano A




JESUS É VIDA E LIBERDADE PARA OS POBRES

Primeira leitura (Zc 9,9-10)
Estamos por volta do ano 323 a.C.. Israel é um povo colonizado, explorado e oprimido por potências estrangeiras. Não obstante, o povo é chamado a alegrar-se porque o Messias prometido está para chegar. Outros profetas já haviam anunciado a vinda do grande rei, do Filho de Davi, do Libertador. Mas Zacarias anuncia que o novo rei será uma pessoa “humilde, montando um jumento, num potro de uma jumenta” (v.9).
Como confiar num rei assim? Os outros reis são ricos, montam em cavalos, tem exércitos, são orgulhosos e arrogantes.
O novo rei fará desaparecer da cidade qualquer força militar, destruirá todas as máquinas de guerra e de violência. Mesmo assim será um vencedor. Seu reino se estenderá do Mediterrâneo ao Mar Morto e do rio Eufrates até os confins da Palestina. Obs. Pela geografia da época, essas eram as fronteiras do mundo.
Jesus realizará ao pé da letra esta profecia quando entrar em Jerusalém montando um burrinho. Com este gesto provará que ele é o rei esperado, aquele que com sua benevolência e o seu amor conquistará o coração dos homens.

Segunda Leitura (Rm 8,9-11)
Todos os homens morrem. A vida material, que o homem tem em comum com os outros seres deste mundo, não dura para sempre, a um certo ponto ela se apaga. Jesus, sendo um homem como nós, também teve que morrer. Ele, porém, ressuscitou.
Na leitura deste domingo Paulo diz porquê isto aconteceu. É que ele tinha em si o espírito de Deus, isto é, a vida de Deus em plenitude.
Paulo continua dizendo que, tendo recebido o espírito de Jesus, nós também não podemos mais morrer. Quando chegar o momento no qual a nossa vida se encerrará, o Espírito que ressuscitou Jesus ressuscitará também os nossos corpos mortais (v.11) à condição que nos oponhamos à sociedade que matou Jesus e façamos também, em nossa condição humana, aquelas opções de vida que orientaram Jesus até o fim: seu empenho pelos pobres a marginalizados da vida.

Evangelho (Mt 11,25-30)
Certo dia Jesus surpreendeu a todos louvando a Deus por seu êxito com as pessoas simples da Galiléia e por seu fracasso entre os mestres da lei, escribas e sacerdotes. “Eu te louvo, Pai... porque escondeste estas coisas aos sábios e entendidos e as revelaste aos pequeninos”. Jesus está contente. “Sim, Pai, porque assim foi do teu agrado”. Assim te pareceu melhor. É a maneira de Deus revelar suas “coisas”. Os “pequeninos” não são as crianças, mas aqueles que reconhecem a sua indigência perante Deus e suspiram pela salvação.
A gente simples e ignorante, aqueles que não tem acesso a grandes conhecimentos, os que não contam na religião do templo, estão se abrindo a Deus com um coração limpo. Estão dispostos a deixar-se instruir por Jesus. O Pai está revelando a eles seu amor através dele. “Deus visitou o seu povo”, diziam. Eles entendem Jesus como ninguém.
Mas os “sábios e entendidos” não entendem nada. Eles têm a sua própria visão erudita de Deus e da religião. Acham que sabem tudo. Jesus não acrescenta nada à teologia deles. Sua visão fechada e seu coração endurecido os impedem de abrir-se à novidade da revelação de Jesus sobre Deus. Além disso, Caifás e os sacerdotes de Jerusalém viam em Jesus um subversivo perigoso. Porque ele se preocupava tanto com os pobres e se esquecia das exigências da religião? Essa convivência de Jesus com as classes marginalizadas causou muito ressentimento entre os líderes da sociedade e foi uma das causas de sua condenação.
Já os camponeses da Galiléia que viviam defendendo-se da fome e dos grandes proprietários de terras entendiam muito bem a Jesus: Deus queria vê-los felizes, sem fome nem opressores. Os enfermos confiavam nele e, animados por sua fé, voltavam a crer no Deus da vida. As mulheres que se atreviam a sair de sua casa para ouvi-lo intuíam que Deus devia amar, como dizia Jesus, com entranhas de mãe.
Jesus termina sua oração, mas continua pensando na “gente simples”. Essas pessoas vivem oprimidas pelos poderosos e não encontram alívio na religião do templo. Sua vida é dura e a doutrina que os “entendidos” lhes oferecem a fazem ainda mais dura e difícil. Os fariseus (“os entendidos”) haviam dissecado os dez mandamentos em 635 preceitos e proibições. Era um peso insuportável. Estavam “cansados e sobrecarregados”. Jesus lhes diz: “o meu jugo é suave e meu peso é leve”.
Jesus reduz os dez mandamentos a dois: amar a Deus e ao próximo e, afinal, a um só: não faças aos outros o que não queres que te façam (é a famosa “regra de ouro” que já o chinês Confúcio propôs aos seus discípulos) e Jesus confirma “ aí está toda a lei e os profetas” (Mt 7,12; cf.tb Rm13,9). Referindo-se à liturgia do templo Jesus diz “é misericórdia que eu quero e não sacrifícios”. Segundo Mt 25, os homens, de qualquer raça ou religião, serão julgados não pelas práticas religiosas mas pelas obras de misericórdia.
“Aprendei de mim que sou manso e humilde de coração” (v.29). Dizendo “Aprendei de mim” Jesus quer dizer simplesmente: não sigais aqueles mestres que se fazem senhores das vossas consciências, que vos anunciam um Deus que não gosta de pobres e vos ensinam uma religião que tira a alegria de viver com exigências mesquinhas e absurdas.
Em seguida Jesus se apresenta como “manso e humilde de coração”. Nada a ver com tímidos, sossegados ou passivos. São os pobres e oprimidos, aqueles que sofrem injustiças, mas que não reagem com violência. Pois bem, para todos os pobres da terra Jesus diz: escutai-me, acreditai em mim, porque eu estou do vosso lado, sou alguém como vós, também sou pobre e rejeitado!
Santo Agostinho declarou um dia: “Os pobres são os nossos mestres”. Esta frase do grande doutor da Igreja é, sem dúvida, uma chamada de atenção para todos nós sacerdotes, moralistas e entendidos em religião. Nós corremos o risco de racionalizar, teorizar e “complicar” demasiadamente a fé. Porque será que há tanta distância entre nossa palavra e a vida real das pessoas? Porque nossa mensagem quase sempre é mais obscura e complicada do que a de Jesus?
Em minha vida de já 48 anos de sacerdote aprendi muito com os pobres. Aprendi a dizer a minha teologia universitária numa linguagem simples e acessível.  Com eles aprendi também, entre muitas outras coisas, que para ser feliz basta muito pouco: “pouco com Deus é muito, muito sem Deus é pouco”...
Em mais de uma ocasião pude comprovar que não basta falar de Deus para despertar a fé. Para muita gente certos conceitos religiosos estão muito gastos e abstratos e já não dizem nada para a vida real. No entanto, encontrei-me com pessoas simples que parecem não necessitar de grandes idéias nem de raciocínios. Intuem logo que Deus é “um Deus oculto”, e de seu coração nasce espontânea uma invocação: “Senhor, mostra-me teu rosto”.
Encontrei-me também com pessoas que se movem sempre no terreno do útil. Algumas abandonam a Deus porque Ele lhes é inteiramente inútil; outras o retêm e lhe prestam culto porque lhes é útil. Mas também pude conhecer pessoas simples que vivem dando graças a Deus. Desfrutam do bom da vida, suportam com paciência os males; sabem viver e fazer viver. Não sei como o conseguem, mas de seu coração parece estar sempre brotando o louvor ao Criador. Sua vida é um acerto.
Num retiro querigmático pude constatar a alegria e a gratidão de pessoas diante de um texto como o de Isaías: “Eu sou o Senhor, teu Deus...já que contas muito para mim, me és caro e eu te amo... Não tenhas medo, pois estou contigo!” (Is 43,4), ou diante do salmo 103,13-14: “Como um pai ama seus filhos com ternura, assim o Senhor se enternece por aqueles que o temem, pois Ele sabe de que somos feitos, lembra-se de que somos pó”. Sim, Deus se revela às pessoas simples.

Comentários

  1. Padre José, parabéns pelo texto, profundo, belo e verdadeiro. Sim, quem tem a graça de celebrar contigo sabe o quão verdadeiro é isso, que você aprendeu a falar de uma maneira simples e clara para as pessoas mais humildes. Que o digam os camponeses do Xaxim!!
    Abraço
    Edlamar

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