Vigésimo Terceiro Domingo do Tempo Comum - Ano B


 



DEUS OPTOU PELOS DESERDADOS DA VIDA

 

Primeira leitura (Is 35,4-7)

O povo hebreu está disperso na Babilônia... O texto de hoje mostra a marcha dos mutilados de Javé voltando para a pátria. A eles dirige-se o  encorajamento do profeta: “Coragem! Não tenham medo! Aí está o seu Deus (35,4ª)” A seguir o texto  esclarece quem são estes  mutilados e desanimados: cegos, surdos, coxos e mudos, em síntese, os mutilados da sociedade. Deus mesmo vai libertá-los do exílio, restituir-lhes a posse da terra e a plena reabilitação física.

Javé dos inválidos e mutilados vai posicionar-se a favor dos que foram privados de ver, ouvir, andar e falar. Em outras palavras, ele é o Deus dos que não tem voz, nem vez.

Os vv.6-7ª mostram outro tipo de transformação:  o deserto e as regiões áridas vão se tornar fontes de água para os romeiros libertados, que caminham ao encontro do Deus da vida em Sião.

 

Segunda Leitura (Tg 2,1-5)

Cf.cap.1º da carta de Tiago do domingo passado.

O cap. 2 dessa carta gira em torno do tema da fé. Em primeiro lugar Tiago afirma que a fé não discrimina ninguém. Em segundo lugar mostra que a fé sem obras, não tem sentido.  Mais. A fé em J.C. não deve admitir discriminação de pessoas. Nos vv.6-7 afirma-se que os ricos oprimem os pobres arrastando-os perante os tribunais, difamando o nome sublime que foi invocado sobre os cristãos. Acontece mesmo que participam da mesma eucaristia, ostentando joias e roupas finas, ocupando lugares de honra enquanto os pobres devem ficar de pé ou sentar no chão.

Tiago, por certo, não quer misturar ricos e pobres na mesma sala, como se isto resolvesse a questão.  A fé não admite consideração de pessoas, ou seja, é impossível ser fiel a Deus e continuar explorando os oprimindo e os pobres. Isto é difamar o nome cristão. A fé torna todos iguais.

 

Evangelho (Mc 7,31-37)

 

O evangelho de Marcos foi o primeiro catecismo da comunidade cristã. Aos poucos, as pessoas vão descobrindo “quem é Jesus’’, para concluir que “verdadeiramente esse homem é Filho de Deus” (Mc 15,39). O texto deste domingo mostra Jesus percorrendo regiões pagãs mostrando o seu interesse para com os pagãos, fazendo deles membros da família de Deus. De fato o evangelho de Marcos se destinava, enquanto texto de catequese, a pagãos dispostos a abraçar a fé.

Em território pagão, Jesus encontra uma pessoa surda que falava com dificuldade (v.32). Jesus leva essa pessoa para fora da multidão. Porque esta atitude? Jesus cura o surdo-mudo longe da multidão para que este se sinta, depois, responsável pelo anúncio daquilo que Jesus lhe fez, tornando-o por sua vez evangelizador, isto é, portador da boa-nova de que “verdadeiramente este homem é Filho de Deus” (15,19).

Jesus cura o surdo-mudo tocando-o. Coloca-lhe os dedos nos ouvidos, e com a saliva lhe toca a língua (v.33). A saliva teve, sempre no mundo antigo, caráter terapêutico. Era uma espécie de “sacramento”. Tocando Jesus o surdo-mudo, é o próprio Deus que se ocupa de quem não podia ouvir nem falar, ou seja, ele está reintegrando em sua dignidade e identidade, alguém que fora privado da vida. Interessante é notar que Jesus toca primeiro os ouvidos e depois a boca: a catequese é primeiramente escuta, assimilação e a seguir, como consequência, é anúncio.

Mas não são os gestos de Jesus que curam o surdo-mudo, e sim sua palavra.  Depois que Jesus ordenou “abre-te” é que seus ouvidos se abriram e sua boca se soltou, e ele começou a falar sem dificuldade (v.35). Com isso Marcos demitiza a ação de Jesus. Ele não é um mágico. Só sua palavra liberta e reintegra, e as pessoas não precisam de rituais ou de magia para abrir os ouvidos e anunciar que ele é o Messias.

Após curar o surdo-mudo, Jesus ordena à multidão que não espalhe a notícia.  Com isso Jesus sugere que o conhecimento de sua pessoa e que de fato só ao pé da cruz e na ressurreição é que se faz a verdadeira revelação de quem ele é (cf. 15,39, comparando com 1,1).  No entanto “quanto mais ele recomendava, mas eles divulgavam” (v.36b). Isso faz pensar na progressão que nosso testemunho sofre à medida que nos comprometemos sempre mais com o projeto de Deus.

O evangelho de Marcos é um aleta para os que se dizem cristãos. De fato ao longo desse evangelho, os discípulos de Jesus são lentos em compreender e lentos também no compromisso. Há muitas passagens em que se fala da incredulidade e cegueira dos discípulos de Jesus. Ora, em território pagão, as coisas são bem diferentes: a multidão crê em Jesus, intercede para que imponha as mãos e cure o surdo-mudo. E o próprio surdo-mudo, depois de curado, torna-se evangelizador. Essa disponibilidade em crer e se comprometer, não facilmente encontrada nos discípulos, emerge rapidamente naqueles que estavam fora, os pagãos. Tudo isso é grande desafio para os que creem ser já cristãos maduros e comprometidos.  E ainda não o são.

 


Comentários

Postar um comentário