Festa da Epifania - Ano B


 

EM JESUS A SALVAÇÃO É OFERECIDA A TODOS


Primeira leitura (Is 60,1-6)

É um texto difícil, de pouco interesse para nós do século XXI, situação, aliás, muito comum na liturgia. O texto se refere à situação desoladora de Jerusalém pós-exílio. Por causa do amor fiel que Javé tem para com Jerusalém a cidade será transformada em ponto de convergência da caminhada das nações.

O anúncio do profeta convida a cidade a levantar-se de sua prostração e resplandecer. A presença de Javé na cidade põe em movimento todas as nações, que começam a peregrinação para a cidade-luz. Tudo isso porque Javé se levanta sobre a cidade, manifestando aí a sua glória. Nessa procissão está a resposta de Javé: ele dá a Jerusalém, filhos e filhas, que vêm a ela carregados ao colo pelas nações. A cidade-esposa tornou-se mãe, cujos filhos são reconhecidos entre todos os povos. Na caravana há também camelos e dromedários, carregados das riquezas de todas as nações do Oriente: Ouro, incenso. Todos se dirigem para a montanha sagrada (v.6), porque a luz do Senhor iluminou também os outros povos. Jerusalém voltou a ser e continuará para sempre, o centro d Universo.

 

Segunda leitura (Ef 3,2-3.5-6)

A libertação e a salvação anunciadas pelos profetas e das quais Jesus falou são para todos os homens e para todas as nações. O projeto de Deus é que judeus e pagãos formem um só povo.

A libertação acontece quando termina a separação entre os homens e Deus e quando entre os homens desaparecem a inveja, as discórdias, a guerra. Surge desse modo uma nova realidade: os homens começam a viver como irmãos, sem suspeitas, sem inveja, sem ódios, sem homicídios. Vivem desse modo porque Cristo lhes ensinou que são filhos de um único Pai.

 

Evangelho (Mt 2,1-12)

Os Magos sempre desfrutaram de muita popularidade e simpatia por parte dos cristãos. Para comprovar isso, basta notar que 150 anos após o nascimento de Cristo, começa a ser reproduzida a figura deles nos cemitérios cristãos.

Os evangelhos são muito discretos em relação aos Magos. Os cristãos nunca se sentiram satisfeitos com as escassas informações encontradas no Evangelho. Faltam muitos detalhes: De onde vinham? Quantos eram? Qual o nome deles? Qual o meio de transporte que usaram? O que fizeram depois que voltaram à sua terra? Onde estão enterrados?

Para responder a todas estas perguntas, surgiram ao longo dos tempos muitas histórias... Foi dito que eram reis, que eram em número de três, que vinham um da África, um da Ásia, um da Europa, e que eram um negro, outro amarelo e outro branco. Guiados pela estrela, se encontraram num mesmo ponto, e depois de percorrerem juntos o último trecho da estrada, chegaram a Belém. Chamavam-se Gaspar, Melquior e Baltazar. Para a viagem serviram-se de camelos e dromedários. Depois de voltarem para casa, após atingir a venerável idade de 120 anos, certo dia, viram novamente a estrela, retomaram a viagem e se encontraram juntos numa cidade de Anatólia para celebrar a missa do Natal, e no mesmo dia, felizes, morreram.

Suas relíquias deram a volta ao mundo e repousam agora na catedral de Colônia, na Alemanha.

Muito bem! Mas estas são histórias! Voltemos agora ao texto evangélico e tentemos entender a mensagem que Mateus nos quer passar. Para isto precisamos esclarecer alguns detalhes.

Primeiro, segundo o evangelho, Os Magos não eram reis. Com certeza pertenciam àquele grupo de pessoas, muito comuns na antiguidade, que sabiam interpretar os sonhos, prever o futuro observando o curso dos astros ou observando o vôo dos pássaros, e sabiam ler a vontade de Deus através dos acontecimentos comuns ou extraordinários da vida.

Não deve causar espanto, portanto, quando se afirma que os Magos conseguiram interpretar, como uma mensagem do céu, o aparecimento de uma estrela.

Com relação à estrela: nos tempos antigos acreditava-se que, quando nascia uma pessoa destinada a uma grande missão, aparecia ao mesmo tempo uma estrela no céu (ainda hoje quando alguém é favorecido pela sorte, ele talvez diga: ôpa, enfim minha estrela brilhou...).

Mas, enfim, os Magos viram de fato um cometa? Muitos astrônomos consumiram boa parte de suas pesquisas e estudos para verificar se, há dois mil anos atrás, apareceu no céu um cometa. Poderiam ter empregado melhor o seu tempo em qualquer outro estudo, pois a estrela que os Magos viram não era um astro material, mas a estrela da qual fala a Escritura.

Vamos aos fatos. Se lermos os capítulos 22-24 de Livro dos Números, encontramos a surpreendente história de Balaão e da sua jumenta falante. Balaão era um adivinho, um mago do Oriente, exatamente como aqueles dos quais fala o evangelho hoje.

Certo dia, ele, sem querer, fez uma profecia importante. Disse: “Eu vejo, mas não é um acontecimento que virá dentro em breve; eu o sinto, mas não está perto: uma estrela desponta da estirpe de Jacó, um reino, nascido de Israel, se levanta... Alguém sai de Jacó e dominará os seus inimigos” (Nm 24,17.19).

Assim falava, cerca de 1.200 anos antes do nascimento de Jesus, Balaão, “o homem do olhar penetrante” (Nm 24,3).

Desde então os israelitas começaram a aguardar com ansiedade o despontar desta estrela que não é senão o próprio Messias.

Estas idéias eram muito familiares para Mateus e para seus leitores. Apresentando-nos os Magos do Oriente que vêem a estrela, o evangelista simplesmente nos quer dizer que finalmente chegou o esperado Libertador da estirpe de Jacó. É aquele Jesus que os Magos reconheceram e adoraram. É ele a Estrela.

Tentemos agora relacionar o Evangelho de hoje com a primeira leitura. O profeta dizia que, quando em Jerusalém tivesse brilhado a luz do Senhor, todas as nações se teriam posto a caminho em direção à cidade santa, levando seus dons. Mateus interpreta o episódio dos Magos como sendo a realização desta profecia: guiados pela luz do Messias, os povos pagãos (representados pelos Magos) se dirigem para Jerusalém, para levar os seus dons: ouro, incenso e mirra.

Da mesma forma, a história da caravana de animais não foi inventada à toa; a primeira leitura já nos fala de “um tropel de camelos e dromedários”, vindos do Oriente (Is 60,6).

Mas então, seremos obrigados a tirar dos nossos presépios e apagar a imagem do cometa? Não! Vamos continuar contemplando esta estrela, vamos apontá-la para nossas crianças, mas ensinemos a elas que a estrela não é um astro do céu, mas é Jesus, é ele a luz que ilumina todos os homens.

Assim sendo, os Magos representam os homens que buscam a luz em meio às trevas.  Alguns exegetas interpretam hoje a lenda evangélica recorrendo à psicologia do profundo. Os Magos representam o caminho seguido por aqueles que escutam os anseios mais nobres do coração humano; a estrela que os guia é a nostalgia do divino; o caminho que percorrem é o desejo. Para descobrir o divino no humano, para adorar o menino em vez de buscar sua morte, para reconhecer a dignidade do ser humano em vez de destruí-la, é preciso percorrer um caminho oposto ao seguido por Herodes.

Os Magos são também a imagem da Igreja, formada por povos de todas as etnias, tribos, línguas, nações. Entrar para a Igreja não quer dizer renunciar à própria identidade, não quer dizer submeter-se a uma injusta e falsa uniformidade. Todas as pessoas e todos os povos devem manter as próprias características culturais, que até enriquecem a Igreja universal. Ninguém é tão rico que não precise de nada e nem tão pobre que não tenha nada para dar.

Nos dias de hoje, como nos tempos de Jesus, diante da estrela as pessoas assumem posturas diferentes. Há as que, como os Magos, se ajoelham (v.11), reconhecem nele a luz do mundo e se submetem; há outras que permanecem indiferentes e outras, enfim, que tentam apagar esta luz. Todos viram a mesma realidade: um menino recém-nascido, mas os corações foram e são diferentes. Quem está em condições de reconhecê-lo? Os que se deixam iluminar pela Escritura que nos fala dele.

 


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