Terceiro Domingo da Páscoa - Ano A



Jesus ressuscitado manifesta-se na Eucaristia

Primeira leitura (At 2,14.22-28)

O texto é parte do discurso de Pedro no dia de Pentecostes. Mais do que citação literal o texto resume a catequese a respeito de Jesus como era ensinada nos primeiros tempos da Igreja para os candidatos ao Batismo.
A forma como Jesus terminou sua vida era um grande escândalo. Como é possível que um justo tenha terminado assim?
Pedro responde que a morte de Cristo estava enquadrada no plano de Deus (v.23). O que para os olhos dos homens foi uma humilhação, uma vergonha, aos olhos de Deus foi uma vitória.
Neste ponto, Pedro usa uma expressão muito forte, diz que “Deus obrigou a morte a dar à luz” (v.24). Os antigos pensavam que os fetos estavam amarrados no ventre materno por laços, que no momento do parto se desatavam. Jesus estava como que amarrado no seio da morte. Deus interveio para libertá-lo e assim causou o seu nascimento. Este é o maior prodígio através do qual Deus revelou o seu poder: do seio da morte trouxe a vida.


Segunda leitura (1Pd 1, 17-21)

Continua a catequese do batismo, iniciada no domingo passado.
Pedro diz aos recém-batizados: agora vocês podem chamar a Deus de “Pai”, porque dele vocês receberam uma vida nova. Esta é uma realidade maravilhosa, mas comporta também graves responsabilidades porque é preciso que a vida se adapte a esta nova condição. Deus de fato não faz distinção de pessoas e diante dele o que tem valor é somente o que se faz (v.17).
Cristo, o Verbo de Deus, o DNA da criação, se solidarizou conosco até a morte. Nele Deus nos aceitou, nos libertou e nos deu vida nova.  Por causa desta solidariedade o que aconteceu com Jesus vale também para nós. Paulo dirá: “Em Cristo nós já morremos e ressuscitamos”.  “De agora em diante já não há nenhuma condenação para aqueles que estão em Cristo” (Rm. 8,1).

Evangelho (Lc 24,13-35)


É fim de tarde do dia 9 de abril do ano 30. Dois discípulos de Jesus que tinham ido a Jerusalém para celebrar a páscoa foram testemunhas de fatos dramáticos: o seu Mestre, um profeta poderoso em obras e palavras, foi condenado à morte.
Passados os dias daquela triste solenidade eles se preparam para voltar para Emaús quando, logo de manhã cedo, alguém corre para eles com notícias, um tanto perturbadoras: o sepulcro foi encontrado vazio, algumas mulheres afirmam ter visto anjos e que Jesus estava vivo.
Em casa, porém, estão as famílias que os aguardam e é chegado o tempo da colheita da cevada; partem. Ao longo do caminho se aproxima deles um viajante que declara não saber o que aconteceu naqueles dias na cidade santa. Eles lhe expõem o seu drama: esperavam que Jesus fosse o Messias, mas foi morto. E concluem: é sempre assim: “a alegria do pobre dura pouco”...
O desconhecido começa então a explicar, através das Escrituras, que tudo o que havia acontecido entrava no plano de Deus.
Chegados ao vilarejo para onde se dirigiam, sentam-se à mesa e no instante em que o misterioso viajante parte o pão, eles o reconhecem: É o Mestre. Sem demora, se levantam e voltam a Jerusalém para anunciar aos outros discípulos a alegre notícia: Jesus está vivo.
A narração dos discípulos de Emaús talvez seja a página mais linda de todos os evangelhos. Linda porque expõe de maneira singela como se deve entender a verdade fundamental da religião cristã: a ressurreição. Um deles se chamava Cléofas, irmão de José, portanto, tio de Jesus. O outro não tem nome: expediente de Lucas para que todo cristão se identifique com ele e acompanhe Cléofas na caminhada.
Os discípulos de Emaús representam os discípulos da terceira geração da Ásia Menor nos anos 80-90 que diziam: como crer e testemunhar que Jesus está vivo se não o vimos com nossos olhos, nem o tocamos com nossas mãos, nem sentamos com ele à mesa?
O drama dos discípulos de Emaús tinha diversos motivos:
  1. Abandonaram os colegas em Jerusalém e decidiram viajar sozinhos;
  2. Fizeram pouco caso do que as mulheres do grupo diziam, achando talvez que fossem alucinações motivadas pela saudade que elas sentiam de Jesus;
  3. Não tiveram a mínima suspeita de que suas ideias sobre o Messias vencedor pudessem estar erradas; e
  4. Se ele está vivo, como dizem as mulheres, porque nós não o vemos? Eles querem ver, tocar um corpo.
Lucas responde com uma catequese: É preciso uma conversão: passar da descrença para a fé. É o que todo homem deve fazer para tornar-se discípulo de Jesus. Para tanto ele precisa ser ajudado. É o que vai acontecer em três momentos:
Primeiro momento: os dois sabem tudo o que aconteceu. Eles interpretavam a vida de Jesus como sendo a de um profeta. Eles haviam esperado que ele fosse libertar Israel. Eles sabem que anjos declararam a mulheres que ele estava vivo. Mas a ele ninguém viu e por isso tudo está bloqueado. Aqui o erro básico: para crer eles queriam ver...
O desbloqueio é feito por uma interpretação das Escrituras. É preciso reconhecer aqui a prática da Igreja.
Lucas quer dizer: vocês não podem ter acesso ao reconhecimento do Ressuscitado se vocês não renunciarem a ver/tocar/achar imediatamente por provas que obriguem. A fé começa justamente quando se renuncia ao ver/saber e se aceita a mediação da Igreja.  A estrada que o Ressuscitado lhes abre para percorrer é o das Escrituras. É a Palavra de Deus que desvenda o mistério: “Ó gente sem inteligência! Como vocês são lerdos de coração para crer em tudo o que anunciaram os profetas. Porventura não era necessário que Cristo sofresse essas coisas e assim entrasse em sua glória? E começando por Moisés, percorrendo todos os profetas, explicava-lhes o que dele se achava dito em todas as Escrituras” (vv.25-27).
segundo momento acontece em volta da mesa. É neste momento que cai a ficha, seus olhos se abrem: o misterioso viajante “tomou o pão, pronunciou a bênção, o partiu e lhes deu” e então sumiu... São as palavras da consagração. Jesus já não precisa estar fisicamente presente.
Lucas quer ensinar que todos podem encontrar o Ressuscitado. Onde? Na celebração comunitária, podem vê-lo através dos sinais dos sacramentos, mas na hora em que o reconhecem... eis que ele já não é mais visível. Sua “´presença física” já não é mais necessária.
O rito é o mesmo da nossa celebração dominical: Entrada do celebrante, 1ª leitura, 2ª leitura, homilia, Fração do pão.
terceiro momento acontece como uma abertura dos olhos sobre o vazio. Assim que reconhecido, Ele se torna invisível, desaparece. É na base desta ausência que eles partem para anunciar. É o sentido do fato que todos os relatos de aparições são relatos de missão.
Concluindo: Na verdade os evangelistas não nos pedem confiar nas aparências sensíveis com as quais eles teriam sido beneficiados. É preciso antes estar atento às Escrituras para chegar à identificação plena e segura do Senhor Ressuscitado. O caminho para a fé não foi fácil para os apóstolos como não o é para nós. Antes como depois da páscoa foi preciso crer.
Os discípulos fizeram uma experiência (mística) que eles relatam com uma linguagem sensível de um encontro porque não tinham outra linguagem para exprimir tal experiência que se instalou profundamente na sua existência, mudando completamente a sua vida.




Comentários

  1. Bravíssimo padre José! Um dos esclarecimentos mais lindos que já li sobre esse texto dia discípulos de Emaús! Edlamar

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