DOMINGO DE PÁSCOA – ANO A DOMINGO DE PÁSCOA – ANO A





O AMOR GERA A FÉ, A FÉ GERA O TESTEMUNHO

Primeira Leitura (At  10,34.37-43)
Esta leitura é tirada de um dos discursos de Pedro. Ele, falando a um grupo de pagãos, resume em poucas palavras a mensagem cristã fundamental em quatro pontos:
  1. Antes de tudo relembra os momentos principais da vida de Jesus. Ele é um homem concreto que passou a vida fazendo o bem e curando todos aqueles que eram vítimas do mal (vv.37-38).
  2. O segundo ponto narra o que os judeus fizeram a este enviado de Deus: mataram-no, pregando-o numa cruz.
  3. Diante desta maldade humana, como Deus reagiu? Ele, diz Pedro, não podia abandonar o seu “Servo” fiel nas mãos da morte. Por isso o ressuscitou.
  4. Por fim fala da missão dos discípulos: eles são testemunhas destes fatos.
Esta leitura é antes de tudo um convite a tomar consciência da verdade fundamental da nossa fé: a ressurreição de Cristo.
Como entender a ressurreição de Jesus? Os textos do Novo Testamento usam diversos termos para designar o que aconteceu com Jesus após a sua morte. Os principais são: Ressurreição, exaltação e glorificação.
Ressurreição faz pensar numa volta à vida de antes da morte ou seja numa reanimação do cadáver, como foi o caso de Lázaro. Não foi assim a ressurreição de Jesus. Já exaltação e glorificação sugerem um modo diferente de existir: uma vida subtraída aos limites de espaço e tempo.
Para entender a mensagem pascal é preciso juntar estes três  termos e entendê-los em conjunto. Pela ressurreição, Jesus adquiriu um corpo espiritual como diz Paulo, o que lhe permite estar em qualquer lugar. Assim, por exemplo, ele pode estar presente em nossa celebração eucarística de uma maneira tão real e verdadeira como na Última Ceia. 
Vocês se lembram do exemplo da lagarta e da borboleta? A lagarta “vira” borboleta. É a mesma criatura, só que a maneira de existir é diferente. Algo semelhante aconteceu com Jesus: após a páscoa ele tinha uma maneira diferente de existir. Ele continua sendo homem, mas a maneira de existir é diferente. Daí as dúvidas dos discípulos a respeito de Jesus após a páscoa: Maria Madalena o confundiu com um jardineiro, os discípulos de Emaus achavam que era um forasteiro, só o reconheceram quando da fração do pão, num outro dia Jesus apareceu na praia e os discípulos pensavam que era um fantasma... 
Também para os discípulos a fé na ressurreição não foi fácil, não foram dispensados do exercício da liberdade. No começo todos duvidaram, não só Tomé. Levou um certo tempo até cair a ficha. Foi um processo lento. Os evangelistas, por motivos catequéticos simplificam um pouco as coisas. Na verdade, antes como depois da páscoa foi preciso crer. Nós pensamos ingenuamente que os discípulos viram o Ressuscitado, e nós temos que crer sem ter visto. É preciso lembrar que o Ressuscitado, tendo um “corpo espiritual” como diz Paulo, é invisível  e não fala. A não ser  por um milagre (!). Assim sendo, não poderia ser fotografado nem gravado. E, no entanto, os discípulos garantem que tiveram um encontro com Jesus, encontro que marcou  suas vidas para sempre. Foi uma experiência interior revolucionária. Exemplo clássico é Paulo que  em Gl 1,16 diz:  “Aprouve a Deus revelar  em mim o seu Filho”. Portanto, foi uma experiência interior. Paulo é  único apóstolo que narra a sua própria experiência: ele não viu nem ouviu Jesus e no entanto aquele encontro fez de um perseguidor fanático o maior apóstolo de todos os tempos. (Já o evangelista Lucas quando narra a conversão de Paulo dramatiza o encontro usa elementos simbólicos: faz intervir luz, fala e cegueira de Paulo... circunstâncias não-históricas).
Nós também podemos e até devemos fazer essa experiência. Milhões de pessoas confessam terem encontrado o Senhor, se converteram e mudaram da água para o vinho.
Os textos do Novo Testamento a respeito da ressurreição não são crônicas. Os evangelistas a relatam cada um  a seu modo. Na verdade são catequese.
Na verdade ninguém presenciou a ressurreição. É um fato sobrenatural, e, portanto, impossível de ser provado. A verdadeira “prova” foi a mudança de vida dos discípulos,  que mudaram da água para o vinho e estavam dispostos  a dar a vida por Jesus ressuscitado. Para admitir que um crucificado é o Messias (o Libertador), algo de muito grave deve ter acontecido...
Da mesma forma nós podemos e devemos “provar” a ressurreição pela nossa vida, se abandonarmos as obras da morte: os ódios, os rancores, as invejas, a violência, as vinganças, os adultérios... então poderemos proclamar-nos testemunhas da ressurreição.

Segunda Leitura (Cl 3,1-4)

Paulo recorda aos cristãos de Colossos que no dia do batismo eles nasceram para uma vida nova, vida que tem sua plena realização não neste mundo, mas no mundo  de Deus. Paulo não diz que os cristãos não devam se interessar pelas coisas deste mundo. Eles trabalham e se ocupam com as coisas materiais como os outros. Todavia têm a plena convicção de que a plenitude da vida não pode ser alcançada aqui. Mesmo que todos os problemas materiais sejam resolvidos, ficam sempre no íntimo do coração humano as perguntas: Porque vivo e porque morro? De onde venho e para onde vou? 
As boas obras não podem faltar; elas não merecem a salvação, porque esta é gratuita: “A justificação  vem pela fé e não pelas obras”, diz Paulo na carta ao Romanos. Mas é verdade também que a fé sem obras é morta(como lemos na carta de Tiago),
Portanto, não justifica. Ou seja, a fé que justifica, é a que produz obras.

Evangelho (Jo 20,1-9)
"Logo pela manhã, no primeiro dia depois do sábado, Maria Madalena foi até o sepulcro. Era ainda escuro... (v.1)."
Este episódio  sugere uma reflexão sobre o papel da mulher na vida de Jesus. Jesus foi o primeiro rabino, mestre ou guru que teve mulheres como discípulas. Era o fim de um tabú. Entre os judeus, só homens podiam ser discípulos. Jesus foi subversivo: Mulheres o seguiam e cuidavam dele, e d’entre elas se destacava Maria Madalena. Quando da paixão, os homens fugiram, as mulheres ficaram...
No domingo de páscoa, Maria Madalena fez um gesto típico de mulher: ela não quis saber se Jesus era culpado ou não, não quis saber porquê foi condenado à morte mais vergonhosa que existia, a morte de cruz, não se importava com o que viessem a pensar dela... a mulher quando ama, vai até o fim. O seu gesto foi um protesto contra o que fizeram com Jesus, e o pior, em nome da religião...
Ainda na manhã da Páscoa Deus manifestou o primeiro sinal da revolução social  que a ressurreição de Cristo pode operar: na sociedade hebraica, a mulher pertencia à categoria das pessoas discriminadas. Como os escravos, as crianças, os pastores, não era considerada testemunha idônea.  Pois bem, Deus escolhe justamente uma mulher para proclamar ao mundo o primeiro anúncio de que a morte foi vencida.
Levou um bom tempo, só no século XII, que a Igreja proclamou Madalena como “apóstola dos apóstolos”.
Jesus resgatou a dignidade da mulher, escolhendo mulheres para discípulas e aparecendo por primeiro a uma mulher depois da ressurreição. Foi um gesto altamente simbólico. Já em vida ele havia igualado a mulher ao homem na questão do divórcio: era o fim do machismo. Era uma re-edição da mensagem do primeiro capítulo do Gênesis: “Deus os fez homem e mulher”, ou seja, o ser humano é 2 em 1: os dois se completam: “serão uma só carne”...   Dizia um famoso teólogo e paleontólogo jesuíta, Teilhard de Chardin:  assim como o homem (ser masculino) não pode viver sem oxigênio, ele não pode viver sem o feminino...
A civilização ocidental levou muitos séculos para reconhecer a igualdade do homem e da mulher.
Hoje, graças a Deus, temos mulheres presidentes, primeiras ministras, deputadas, senadoras, prefeitas etc.  Isto na sociedade civil...
É uma pena que na Igreja a mulher ainda continua em segundo plano. Penso que a mulher, pelas qualidades e carismas tipicamente femininas é muito importante para a evangelização. Ora, a evangelização é a missão fundamental da Igreja: então tudo o que contribuir para melhorá-la e enriquecê-la deve ser adotado.  Um argumento sempre de novo aduzido para excluir a mulher da hierarquia é o fato de Jesus não ter incluído uma mulher entre Os Doze. Mas este é um argumento falso. Naquele tempo, consideradas as circunstâncias culturais, não faria sentido escolher mulheres para representar as doze tribos de Israel. É o famoso argumento do silêncio: o que Jesus não fez não pode ser feito hoje.
Mas, e o Espírito Santo, não foi prometido para introduzir a Igreja em toda a verdade, e atualizar a mensagem de Jesus de há dois mil anos atrás?





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